quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015


Qualquer um dos quatro filmes da filmografia do mexicano Alejandro González Iñárritu, que se iniciou no ano de 2000 com o excelente AMORES BRUTOS, refletem o modus operandi de fazer cinema do diretor. Goste-se ou não, seu trabalho sobrevive de um cinema arrojado que tem na mão pesada sobre a direção o principal modelo de construção da narrativa, quase sempre cíclica e distante do tradicional eixo linear - quem se lembra do fabuloso quebra-cabeça narrativo de 21 GRAMAS?e apoiado em uma sequência de eventos que são consequência de um estrondo de violência física que desarranja os personagens.

Iñárritu repete em seu filme mais recente, BIRDMAN (OU A INESPERADA VIRTUDE DA IGNORÂNCIA), que entrou no Oscar 2015 com nove indicações e saiu de lá gloriado com quatro (melhor filme, diretor, roteiro original e fotografia) o arrojo na construção da cinematografia. Mas é curioso que para amadurecer ainda mais em sua proposta, ele abandone um de seus mais fortes preceitos (a narrativa fragmentada) e desloque o momento mais violento do filme (que deixa de criar caminhos para a trama para passar a ser um ponto de explicação para ela), para fixar a discussão em um profundo nível psicológico, quase onírico. A história é centrada no personagem de Riggan Thomson (interpretado por Michael Keaton), um ator de cinema dono de um único mega sucesso na carreira (o super-herói Birdman), que tenta resgatar a vida profissional com a montagem de uma peça de teatro em Nova York e se depara com uma série de problemas ao seu redor (a perseguição de uma crítica de cinema, a chegada de um novo ator-problema no elenco, a possível gravidez não planejada de sua namorada e uma filha-problema). 

Filmado em um forjado plano-sequência único, a câmera de Iñárritu passeia pelo espaço e o domina nos mais diversos enquadramentos possíveis (um trabalho esplendoroso feito em conjunto com o diretor de fotografia, Emmanuel Lubezki), artifício que funciona como uma "perseguição" ao protagonista, jogando-o em um crescente processo de ruína psicológica - representado pela presença cada vez mais constante do super-herói Birdman em sua mente (não será difícil lembrar de CISNE NEGRO e da trajetória da bailarina Nina durante a exibição do filme). E por ser o perfil psicológico do ator e sua busca pela fama perdida o aspecto que mais circunstancia toda a discussão do filme, o espectador é convidado a entrar nesse caminho ascendente junto ao protagonista - não estranhe o início lento e aparentemente ilógico da trama: faz parte do delicioso e explosivo terço final que justifica todas as escolhas de Iñárritu.

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Para ver: BIRDMAN (OU A INESPERADA VIRTUDE DA IGNORÂNCIA) (Birdman, Or the Unexpected Virtue of Ignorance, 2014, de Alejandro Gonzáles Iñárritu). Com Michael Keaton, Emma Stone, Zach Galifianakis, Naomi Watts, Edwart Norton, Amy Ryan). 
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