quinta-feira, 15 de agosto de 2013

To The Wonder

O sempre reflexivo Terrence Malick parece ter gostado da busca pela representação da subjetividade no cinema através das imagens fugidias. Após o cultuado A ÁRVORE DA VIDA, vencedor da Palma de Ouro em Cannes há dois anos, um retrato belíssimo sobre os acontecimentos da vida que cercam o homem e seu entorno, ele retoma o olhar apurado para o espaço existente entre o homem e a natureza, se afastando da grandiloquência e apostando em uma discussão mais intimista que parece ser uma extensão do assunto apenas tangenciado no filme anterior: a existência de relacionamentos incondicionais desprovidos de qualquer razão, do qual muito pouco se pode explicar – como a origem da vida.

Entre Paris e Oklahoma, Ben AffleckRachel McAdams e Olga Kurylenko vivem um triângulo amoroso impregnado de incertezas, cuja permissão parte dos próprios e é originada pela dificuldade intrínseca ao homem de se comunicar. O discurso sobre aceitar a incondicionalidade do sentir diante daquilo que não se pode provar logicamente – nem sempre o que se diz é o que se quer dizer –, ressoa nos dilemas do personagem vivido por Javier Bardem, um padre que questiona a existência de Deus e a ligação Dele com o homem – talvez por esperar por aquilo que não se concretize (bem semelhante ao ato de se relacionar romanticamente). A consequência é uma crise existencial que Malick prefere contemplar e, com os pouquíssimos diálogos e uma lacônica narração em off, apresentar através dos planos abertos sobre a paisagem a presença de algum personagem de braços estendidos, movimento de diretor e personagem em uma busca de respostas – em um filme sobre a incomunicabilidade entre pessoas, o diretor aposta em um elenco mudo e incrivelmente gestual e os poucos diálogos são falados em quatro idiomas diferentes.

O arranjo espacial e o cromático que envolve a paisagem natural, passando pela arquitetura dos cenários e até as vestimentas e os acessórios utilizados pelos atores, apresentam algumas dicotomias interessantíssimas para serem analisadas mais profundamente – até por que devem significar mais do que meras escolhas de oposição de personagens (em especiais as que envolvem os dois polos femininos da trama). As escolhas do cinema de Malick caminham outra vez para unir forma e conteúdo e a difícil comunicação entre personagens transpassa para a própria narrativa do filme, que mesmo sem um argumento tão filosófico (ou 'difícil') quanto o antecessor, aposta de forma pesada nesse cinema fugidio – e talvez essa seja a grande questão do filme e o motivo de ter dividido tanto a opinião da crítica desde sua estreia: a subjetividade impressa é resultado de um modo de fazer cinema cada vez mais autoral (‘o jeito Malick de filmar’) ou uma extensão piedosa e preguiçosa de um sucesso retumbante?
De qualquer forma, é difícil não enxergar na obra a poesia das sublimes imagens vistas nesse processo de subjetivação do cinema e encarar seu autor, Malick, como um pintor impressionista do século XIX que se afasta do realismo e transforma seu cinema em uma degustação para olhos e alma.
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Para ver: AMOR PLENO (To The Wonder, 2012, de Terrence Malick). Com Ben Affleck, Olga Kurylenko, Rachel McAdams, Javier Bardem.
Cotação:4estrelas   



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AMOR PLENO está em cartaz no Cine Jardins

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